ILUMINADO – Parte 3 de 5

Deixa o ambiente hostil subindo no primeiro ônibus que lhe servia. Dentro havia poucas pessoas, em sua maioria donas de casa buscando seus filhos na escola e alguns office-boys com documentos na mão. Todos olhavam para ele tentando decifrar o que este jovem bem trajado fazia saindo do centro ao invés de estar indo ao trabalho. Os olhares de decepção das donas de casa se intensificavam. A inveja dos office-boys o corroia por dentro. Saltou três pontos antes do destino e caminhou com passos apressados, demonstrando um atraso ao compromisso inexistente. Em sua essência estava compromissado com ele mesmo.

Entra em seu apartamento trancando as portas e janelas, querendo provar a si um motivo claro de sua ausência. Na escuridão do ambiente, em meio a uma tosse forçada e um trago de água, a solidão assola seus pensamentos. O que ele precisaria fazer? Precisava de dinheiro para viver. O dinheiro precisa do suor para nascer. O quanto ele deveria transpirar para sobreviver? Automaticamente começa a fazer flexões, observando suas secreções pingarem no chão. Desperdiçava seu suor no solo errado, nunca nasceria nada dali. Deixar o emprego era uma possível solução, mas de onde colheria os frutos da Casa da Moeda? Suas economias estavam preservadas, conseguiria sobreviver por duas semanas até encontrar outra fonte da juventude. Ligaria para o antigo emprego e mandaria seu antigo chefe para aquele lugar. Diante do telefone percebe o aluguel não quitado sobreposto. Abre-o para relembrar o tamanho do estrago. O IPTU aumentara, esvaindo suas reservas econômicas. Ainda não era hora, nem o momento. Faz a ligação para sua empresa e avisa que estava doente.

Passado a semana na conhecida inércia, recebe a quantia equivalente aos litros transpirado: o suficiente para iniciar os planos. Após a confraternização com os futuros antigos companheiros, segue em busca da inspiração. Ao entrar em seu ambiente protegido, uma nova surpresa: a conta de luz atrasada adiantara-se. Lá se vão suas economias, levando consigo seus sonhos de liberdade. Torna a ligar ao seu futuro antigo chefe para confirmar presença na semana seguinte. As semanas seguem com o revezamento de cobranças: cartão de crédito, água e televisão. Quando o aluguel renova o ciclo, percebe a falta de evolução do processo adotado e decide por uma tática mais ousada: cozinharia sua própria comida, voltaria direto para a casa, excluir-se-ia do mundo cidadão, sair na rua requer muita transpiração. Deveria armazená-la, guardá-la em seus poros, esperando o momento certo para a secreção. O mês inerte custou passar: difícil se entreter sem poder gastar. Entretenimento custa caro e requer status adequado. Após dias de reclusão, chegara o momento: havia suado o suficiente para pagar o aluguel, a luz, a água, o cartão e a televisão. E ainda sobrava a quantia planejada para colocar o plano em ação. A criança feliz saiu do trabalho sem olhar pra trás, com a exceção de voltar-se para mandar seu chefe aquele conhecido lugar. Sentindo-se liberto, flutua entre o transito sufocante da cidade. Deseja uma ótima noite ao zelador do edifício e abre a porta com um carisma há muito esquecido. Porém, não é de flores que se vive hoje em dia. Ao lado do aluguel estava destinado a ele um envelope desconhecido. Toda beleza se esvai ao identificar uma multa de tráfego em seu nome. Como isto poderia ter acontecido? Nem carro possuía. Certamente deveria ser um mero engano. Entra em contato com o serviço de transito e descobre um celta em seu nome. Como é que podia? Nem carta de motorista tinha! Abre sua gaveta de documentos e lá estava, sua carta devidamente registrada e o documento de um celta preto desconhecido. Uma alegria invadiu seu desejo: poderia vendê-lo, seria a quantia mais que necessária para a sua alforria. Desce do apartamento procurando sua passagem para a liberdade. Na garagem nada havia. Na rua nem um volante. Não havia nada, apenas uma nova conta levando consigo a alegria.

Retorna desolado para suas quatro paredes: a sua vida era insignificante e injusta. Vivia apenas entre contas e trabalho, em meio a suor e pagamento. Onde estaria a plenitude do momento? Quem estaria vivendo os frutos do cotidiano com a bênção do entretenimento? Sua vida não lhe pertencia. Nada lhe pertencia. Era inteiro sado-monogâmico de si. O escárnio da sociedade, fruto da sobriedade, um personagem esdrúxulo de um livro monótono inacabado. Um personagem… O Alter-ego de um escritor. A mesmice da rotina, a fuga da sabedoria, a identidade perdida nas entrelinhas de um conto sem graça. Era a desgraça da vida.

 

Sobre PSCICÓTICO

Pscicótico é um pseudônimo, ou apenas um anônimo, ou simplesmente um pseudo. Por que, então, utilizar o anonimato? Nas palavras de outro anônimo: "Por saudades do tempo em que eu era absolutamente desconhecido e, portanto, aquilo que dizia tinha alguma possibilidade de ser entendido. O contato imediato com o eventual leitor não sofria interferências. Os efeitos do livro refletiam-se em lugares imprevistos e desenhavam formas a que nunca havia pensado. O nome constitui uma facilitação." Por que Pscicótico? Na análise mais simples da pscicanálise, o psicótico é aquele que perde o contato com a realidade. Não estou aqui pra lhes falar verdades, muito menos expor os fatos, a mídia jornalística pode muito bem se encarregar de enganar-te. Estou pra transcender, para metamorfosear minha consciência, transparecer toda a minha demência de uma mente ezquizofrênica e caótica, onde em cada etapa assume uma diferente personalidade. Somos muitos, milhares e diversos. Somos alegres, deprimidos e perversos. Somos a realidade e o seu verso.
Esse post foi publicado em criação dos participantes. Bookmark o link permanente.

Deixe um comentário